A Doença de Legg-Calvé-Perthes ocorre quando o suprimento de sangue para a cabeça do fêmur é temporariamente interrompido. Sem essa circulação sanguínea, as células ósseas sofrem necrose avascular, levando à morte celular no local. Essa é uma condição rara na infância que afeta o quadril e seu desenvolvimento saudável.
À medida que a doença progride, o osso da cabeça do fêmur — a “bola” da articulação do quadril — enfraquece gradualmente e pode entrar em colapso. Embora o processo possa durar anos, em muitos casos, o suprimento de sangue retorna com o tempo, permitindo que o osso se regenere e cresça novamente.
Procurando Por: Luxação Congênita do Quadril: Tudo o que Você Precisa Saber
Estágio da Doença de Legg-Calvé-Perthes
A Doença de Perthes, também conhecida como Legg-Calvé-Perthes, recebeu esse nome em homenagem aos três médicos que a descreveram pela primeira vez. Ela ocorre principalmente em crianças entre 4 e 10 anos e é mais comum em meninos. No entanto, em meninas, é provável que cause danos mais extensos ao osso. Em cerca de 10% a 15% dos casos, ambos os quadris são afetados.
Existem quatro estágios na Doença de Legg-Calvé-Perthes:
Inicial (necrose)
Nesta fase, o suprimento de sangue para a cabeça femoral é interrompido, causando a morte das células ósseas. A área fica inflamada e irritada, e a criança pode começar a apresentar sinais da doença, como mancar ou andar diferente. Esse estágio pode durar vários meses.
Fragmentação
Durante um período de 1 a 2 anos, o corpo remove o osso morto sob a cartilagem articular e substitui rapidamente por um osso inicial mais macio. Nesta fase, o osso está mais fraco, e é esperado que a cabeça do fêmur entre em colapso, adquirindo uma forma mais plana.
Reossificação
Um novo osso mais forte começa a se formar, dando origem à estrutura da cabeça do fêmur. Esta é, muitas vezes, a fase mais longa da doença, podendo durar vários anos.
Curado
Nesta etapa, o crescimento ósseo está completo e a cabeça femoral adquire sua forma final. A forma arredondada da cabeça do fêmur dependerá da extensão do dano ocorrido na fase de fragmentação e da idade da criança ao início da doença, fatores que influenciam o potencial de crescimento ósseo.
A Causa da Doença de Legg-Calvé-Perthes
A causa da Doença de Legg-Calvé-Perthes permanece desconhecida, mas pesquisas indicam que uma predisposição genética pode estar associada ao desenvolvimento da condição, embora ainda faltem comprovações científicas. Um fato interessante é que, apesar de sua raridade, a doença ocorre principalmente em crianças, afetando de forma mais grave o sexo feminino. Essa condição pode impactar o crescimento e a forma final do osso, especialmente quando ocorre em uma idade precoce, o que torna o diagnóstico e acompanhamento essenciais para uma melhor qualidade de vida no futuro.
Sintomas da Doença de Legg-Calvé-Perthes
Um dos primeiros sinais da Doença de Legg-Calvé-Perthes é a maneira como a criança anda e corre, o que pode se tornar mais evidente durante as atividades esportivas. Outros sintomas comuns incluem:
- Mancar, apresentar movimentos limitados ou desenvolver um estilo diferente de corrida, devido à irritabilidade na articulação do quadril;
- Dor no quadril, na virilha ou em outras partes da perna, como a coxa ou o joelho;
- Dor que aumenta com a atividade e melhora com o repouso;
- Espasmos musculares dolorosos, causados pela irritação ao redor do quadril.
Conforme o nível de atividade da criança, os sintomas podem aparecer e desaparecer ao longo de semanas.
Tratamento
Após avaliar os sintomas da Doença de Legg-Calvé-Perthes e o histórico do paciente, o ortopedista infantil realizará um exame físico completo para analisar a amplitude de movimento do quadril, uma vez que essa condição limita significativamente a mobilidade da articulação.
O exame de Raio-X é fundamental para o diagnóstico, pois fornece imagens detalhadas de estruturas densas, como os ossos, confirmando a presença da Doença de Legg-Calvé-Perthes.
O objetivo principal do tratamento da Doença de Legg-Calvé-Perthes é aliviar os sintomas dolorosos, proteger a forma da cabeça femoral e restaurar o movimento normal do quadril. Sem tratamento, a cabeça do fêmur pode se deformar e não se encaixar adequadamente no acetábulo, o que pode resultar em problemas de quadril na vida adulta, como artrite precoce.
Existem várias opções de tratamento para a Doença de Perthes, e o especialista avaliará fatores importantes, incluindo:
- Idade da criança: crianças menores de 6 anos têm um maior potencial para desenvolver novos ossos saudáveis;
- Grau do dano femoral: quando mais de 50% da cabeça femoral é afetada pela necrose, o potencial de remodelação sem deformidades é reduzido;
- Estágio da doença no momento do diagnóstico: o tratamento dependerá do estágio em que a doença se encontra.
Este tratamento personalizado é essencial para garantir a melhor recuperação e qualidade de vida para a criança.
Tratamento não cirúrgico
Para crianças entre 2 e 6 anos que apresentam poucas alterações na cabeça femoral em exames iniciais, o tratamento recomendado frequentemente é a observação. O ortopedista infantil deve monitorar regularmente o paciente com raio-x para garantir que o desenvolvimento da cabeça femoral esteja progredindo adequadamente ao longo do processo da Doença de Legg-Calvé-Perthes.
Os sintomas dolorosos resultam da inflamação na articulação do quadril, sendo recomendados medicamentos anti-inflamatórios para aliviar a dor. Conforme a criança avança nos estágios da doença, o especialista pode ajustar a dosagem ou suspender a medicação, conforme necessário.
A rigidez do quadril é uma complicação comum na Doença de Perthes, e atividades de fisioterapia são amplamente recomendadas para restaurar a amplitude de movimento da articulação. Se a mobilidade se tornar limitada ou os exames mostrarem início de deformidade, um gesso ou órtese pode ser indicado para manter a cabeça do fêmur em sua posição correta dentro do acetábulo.
Após a retirada do gesso, normalmente de 4 a 6 semanas, a fisioterapia é essencial para restaurar os movimentos do quadril e joelhos. O médico pode recomendar o uso do gesso até que o quadril atinja o estágio final do processo de cicatrização, garantindo uma recuperação mais eficaz e uma melhor qualidade de vida.
Veja Mais: Escoliose Idiopática em crianças
Tratamento cirúrgico
A Doença de Legg-Calvé-Perthes pode exigir cirurgia para restaurar o alinhamento correto dos ossos do quadril e manter a cabeça do fêmur dentro do acetábulo até a cicatrização completa. Essa cirurgia é indicada especialmente quando:
- A criança tem mais de 8 anos no momento do diagnóstico. Em crianças mais velhas, o potencial de deformidade durante a reossificação é maior, tornando essencial a proteção da cabeça femoral.
- A cabeça femoral está mais de 50% danificada. Manter a cabeça femoral dentro do acetábulo auxilia no desenvolvimento adequado do osso.
- O tratamento não cirúrgico não consegue manter o quadril na posição adequada para a cura.
O procedimento mais comum para tratar a Doença de Legg-Calvé-Perthes é a osteotomia, na qual o osso é cortado e reposicionado para manter a cabeça femoral ajustada no acetábulo. Esse alinhamento é mantido com parafusos e placas, que são removidos após a cura.
Em alguns casos, o fêmur é cortado para realinhar a articulação e o encaixe é aprofundado, já que, durante a cicatrização, a cabeça do fêmur pode aumentar e perder o encaixe adequado. Para proteger o alinhamento, é comum o uso de gesso por algumas semanas. Após a remoção do gesso, fisioterapia é recomendada para restaurar a força muscular e a amplitude de movimento. Apoios como muletas ou andadores são indicados para diminuir a carga sobre o quadril, e o processo de cura é monitorado com exames de raio-x.
O prognóstico a longo prazo para crianças com a Doença de Legg-Calvé-Perthes é positivo na maioria dos casos. Após 18 a 24 meses de tratamento, a maioria das crianças retoma as atividades diárias sem limitações e atinge a vida adulta sem problemas no quadril.
Caso reste alguma deformidade na forma da cabeça femoral, há maiores riscos de complicações futuras. Contudo, se a cabeça deformada ainda se encaixar no acetábulo, complicações podem ser evitadas. Em casos em que o encaixe não é adequado, há maior chance de dor no quadril e artrite precoce na idade adulta.
Tem dúvidas? Deixe seu comentário ou marque uma consulta!
A prevenção e o cuidado com os pequenos são sempre a melhor escolha!
Dr. João Pedro Rocha
Ortopedista Pediátrico
Dr. João Pedro Ramos Sampaio Rocha é ortopedista especializado em ortopedia pediátrica e neuro-ortopedia. Formado pela Faculdade de Medicina da USP, completou residência em Ortopedia e Traumatologia no Hospital das Clínicas e especializou-se em ortopedia pediátrica e neuro-ortopedia na mesma instituição. Atua como médico assistente e preceptor no HSPM, assistente voluntário do grupo de ortopedia pediátrica do IOT-HC-FMUSP e opera em diversos hospitais de São Paulo. Fundador do Instituto Torus – Ortopedia Pediátrica Especializada. Suas áreas de expertise incluem pé torto congênito, displasia de quadril, paralisia cerebral, doença de Perthes e fraturas infantis. É membro da SBOT, SBOP e AOTrauma Internacional.